JÁ NÃO TENHO TEMPO

Contei os meus anos e descobri que terei menos tempo para viver daqui para a frente do que já vivi até agora. Sinto-me como aquele menino que lhe deram uma bacia de mangas. As primeiras, ele come-as displicente, mas quando percebe que faltavam poucas ele as rói até ao caroço.
Já não tenho tempo para lidar com mediocridades.
Não tolero mais falsidade de gente que fala por trás, gente ingrata que esquece o bem que lhes fizemos nos momentos difíceis. Não tolero ingratidão. Inquieto-me com invejosos que tentam destruir os outros, cobiçando seus lugares, talentos e sorte.
Já não tenho tempo para discutir o óbvio, os erros e os acertos de contas com o passado.
Já não tenho tempo para administrar melindres de pessoas, que apesar da idade continuam imaturas.
Não quero ver os ponteiros do relógio avançarem em confrontação para “tirar os factos a limpo”.
Detesto fazer acareação de desafectos de pessoas infelizes que responsabilizam os outros pelos seus próprios fracassos.

Entrego essas pessoas a Deus.
Lembro-me duma frase de Mário de Andrade que me marcou: “As pessoas não debatem conteúdos, debatem apenas os rótulos”.
O meu tempo tornou-se escasso, quero a essência, a minha alma tem pressa...
Sem muitas “mangas na bacia”, quero viver ao lado de gente humana, que sabe rir com os seus fracassos, não se encanta com os triunfos, não se considera eleito antes da hora, não foge da sua mortalidade, que defenda a dignidade dos marginalizados e deseje tão somente caminhar ao lado de Deus.
Quero caminhar perto das coisas e das pessoas de verdade. Fazer o resto da minha caminhada com paz e serenidade. Desfrutar deste amor absolutamente sem fraudes, nunca será uma perda de tempo.
O essêncial faz a vida valer a pena. Nada neste mundo faz sentido se não tocarmos o coração das pessoas.
Se nós crescemos com os duros golpes da vida, também podemos crescer com os toques suaves na alma.
Já não tenho muito tempo. Quero aproveitar “até ao caroço”os anos que tenho.

(O autor do texto? Não sei…)